‘Tem que correr atrás’: dificuldades que os jovens enfrentam para encontrarem sua primeira oportunidade no mercado de trabalho

Por – Giovanna estrela, larissa Gonçalves, Levi estrevão, Mateus Amorim

Só não consegue quem não quer

Que o desemprego assombra o país, não é nenhuma novidade. Nesse cenário, um desafio está à espera dos jovens brasileiros: a inserção no mercado de trabalho. Desde o ensino médio — e muitas vezes até antes —, adolescentes se preparam para adentrar no ramo de atividades trabalhistas. Alguns tampouco conseguem concluir o colegial ou sequer entrar em uma universidade. A única certeza é que, para a maioria, a sobrevivência depende do trabalho.

Conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS), a juventude é considerada o período entre os 15 e 24 anos. Assim, a legislação brasileira permite o trabalho a partir dos 14 anos, na qualidade de jovem aprendiz, estabelecendo diretrizes para que as organizações brasileiras possam empregar os jovens de forma regulamentada. A lei de aprendizagem é considerada um instrumento de inclusão social que possui como objetivo oferecer oportunidades para os jovens que estão em busca do primeiro emprego e que pretendem se qualificar.  

Contudo, a realidade não é bem assim. Estudo divulgado pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), por meio da solicitação do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), mostra que os jovens são uma parcela vulnerável no mercado de trabalho. A inexperiência é um problema comum que dificulta a busca por oportunidades, fazendo com que aceitem menores salários, jornadas de trabalho mais longas ou duplas, maior rotatividade e informalidade. 

“Eu acho que o principal desafio é a questão da experiência”, diz Beatriz Fernandes, 21 anos, que também está à procura de emprego. Ela conta que, até hoje, só conseguiu um registro na carteira de trabalho, em uma loja de departamentos onde, de acordo com ela, era explorada. “Só fiquei três meses, que foi o tempo de experiência, depois eles me despejaram. Todos os outros foram ‘bico’, não foi nada de carteira assinada”, afirma. Para tentar se colocar no mercado, ela fez um curso no Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) de assistente administrativo.

Não muito diferente de Beatriz, Bárbara de Azevedo, 24 anos, é formada em gestão pública e, atualmente, faz um curso de técnico em administração para se especializar e conseguir competir por uma vaga no mercado de trabalho. Ela afirma que teve dificuldades em arrumar o primeiro emprego. A jovem se formou em 2017, numa escola pública, e desde então buscava pela primeira oportunidade. Durante a graduação em gestão pública ela passou por três estágios até, finalmente, conseguir um emprego formal, contudo, fora da área de formação.  

 “Já havia tentado vagas de menor aprendiz, auxiliar de serviços gerais, caixa, vendedora, e até em outras profissões, mas eu nunca fui chamada nem para entrevista. Já tive até que trabalhar na rua vendendo café da manhã. Mas eu sempre tentei área administrativa, que é a minha formação”, relata Bárbara. 

No Brasil muitas dificuldades são enfrentadas pelos jovens, dentre elas o acesso à educação de qualidade, a limitação geográfica dos programas de capacitação, o choque de horários entre trabalho e estudo, a falta de oportunidades de estágio e a escassez de programas de capacitação, além da alta concorrência, a falta de experiência profissional na área de atuação e a demanda por necessidades específicas, em alguns casos, por parte dos empregadores.  

A gestora de recursos humanos Joana Melo acredita que a maior dificuldade é entrar em uma formação e conseguir finalizá-la. “Muitas vezes as dificuldades financeiras e familiares são impeditivas desse processo. É necessário haver mais incentivos governamentais e das próprias empresas onde os estagiários atuam para conseguirem finalizar seu curso.”

Reportagem especial

Bárbara Cristine Nery de Azevedo, 24 anos
Atua como assistente administrativo

Beatriz Fernandes Duarte Ximenes, 21 anos
estudante de design de interiores

Barreiras Estruturais

Segundo a Pesquisa de Emprego e Desemprego no Distrito Federal (PED-DF), a partir de uma  análise realizada entre maio de 2020 e abril de 2021, 31% dos jovens de 18 a 24 anos estavam fora do mercado de trabalho. A busca pela emancipação está sujeita a mudanças nas tendências de desenvolvimento e igualdade, que estão em constante evolução.  

Entre os jovens de 18 a 24 anos que não estudavam, 45,3% trabalhavam ou procuravam um posto de trabalho e 10,8% se dedicavam a outras atividades fora do mercado de trabalho. A pesquisa aponta que o fenômeno do “nem-nem”, como são chamados os jovens que não trabalham e não estudam, representa 7,8%.

Independentemente da faixa etária observada, a exclusão ocupacional entre jovens atingia diferencialmente a parcela feminina. A pesquisa aponta que o desemprego afeta mais as mulheres, que representam 39,3%, enquanto os homens somam 31,6%.  Sarah Dias Soares, 23 anos, conta que está desempregada mesmo tendo ensino médio completo e experiência prévia no mercado de trabalho. “Enfrentei dificuldades para encontrar emprego devido à maternidade. Infelizmente, é cada vez mais difícil conseguir uma colocação profissional sendo mãe nos dias de hoje”, afirma.

O recorte racial também é importante para entender o cenário. A presença de jovens negros entre os que apenas trabalham é ainda mais intensa do que entre os jovens em geral, representando 69,2%. Por outro lado, a participação dos jovens não negros é relativamente maior do que o percentual observado entre os jovens que conciliam estudo e trabalho, atingindo 37,1%. Essa disparidade é ainda mais acentuada na faixa etária de 18 a 24 anos, onde 71,9% dos jovens negros se dedicam exclusivamente ao trabalho, enquanto 39,1% dos jovens não negros estudam e trabalham simultaneamente.

Essa situação merece destaque, pois demonstra a maior dificuldade dos jovens negros em conciliar estudo e trabalho, especialmente na faixa etária em que é comum estarem concluindo o ensino médio ou buscando níveis mais elevados de formação. Isso é relevante para uma inserção mais qualificada no mercado de trabalho.

Prova desse fato é a estudante de Ciências Sociais, Hellen Rodrigues Batista, 26 anos. Assim como os dados apontam, Hellen menciona que enfrenta diversos problemas ao tentar se inserir no mercado de trabalho quando o assunto é trabalho qualificado e com remuneração adequada. “Acredito que o classismo e o racismo têm sido obstáculos para conquistar as vagas de trabalho para as quais me candidato, mesmo com minha qualificação”, diz. 

Ela conta que, embora não esteja empregada atualmente, durante muito tempo realizou curtos trabalhos voluntários, na tentativa de buscar adquirir conhecimentos e desenvolver habilidades. “Tenho convicção de que posso trabalhar na minha área de formação, sendo a sociologia. No entanto, reconheço que mudanças estruturais precisam ocorrer no mercado de trabalho brasileiro para que pessoas qualificadas, mas desfavorecidas, deixem de ocupar funções subalternas em nossa sociedade. É necessário superar as barreiras sociais e promover uma maior equidade de oportunidades para todos”, afirma.

Segundo a Secretaria de Desenvolvimento Econômico Trabalho e Renda do Distrito Federal (SEDET-DF), há dois perfis do jovem desempregado: “O de baixa renda, com pouca escolaridade e sem qualificação profissional e o segundo, o jovem que não tem a necessidade de ir em busca de uma vaga de emprego. Esse tem um provedor em casa, geralmente pai ou mãe, e usa seu tempo disponível para estudar, ou para concurso público, ou para se aperfeiçoar e qualificar para o mercado de trabalho”.

Hellen Rodrigues Batista, 26 anos
A estudante de Ciências Sociais

Sarah lays dias soares, 23 anos
se encontra atualmente desempregada

E agora, o que eu faço?

O mercado de trabalho está cada vez mais competitivo e em constante evolução. A desocupação e a permanência em posições de trabalho precário têm se tornado uma realidade preocupante para muitos jovens. Esse fenômeno, também conhecido por “efeito cicatriz”, impacta a vida financeira desses indivíduos e pode acarretar consequências desastrosas na trajetória profissional a longo prazo.

A desocupação, resultado de crises econômicas ou transformações no mercado de trabalho, coloca os jovens em uma situação desafiadora desde o início de suas trajetórias profissionais. A ausência de experiência combinada à escassez de oportunidades pode levar à diminuição da autoconfiança e autoestima, afetando negativamente sua motivação e perspectivas para o futuro. Esses fatores exercem um impacto significativo na saúde mental dos jovens, desencadeando uma série de efeitos psicológicos prejudiciais. A incerteza em relação ao futuro, a pressão financeira e a falta de estabilidade contribuem para o surgimento de problemas psicológicos entre os jovens desempregados.

É o caso da jovem Izadora Gomes (nome fictício), de 19 anos, que passou a ter crises de ansiedade e depressão devido ao desemprego. “Tranquei a faculdade por motivos financeiros e perdi meu estágio. Resolvi procurar um emprego porque parada eu não podia ficar, mas não consegui. Ficar em casa sem fazer nada, sem algo para ocupar a mente, me adoeceu. Passei a ter crises de ansiedade e depressão. Não sei quando voltarei a estudar e muito menos quando irei conseguir trabalhar. Estou tentando não perder as esperanças”, desabafa. 

Os efeitos da desocupação também afetam o crescimento da economia do país. Quando os jovens enfrentam dificuldades para encontrar empregos estáveis e bem remunerados, ocorre uma perda de produtividade e um desperdício de talentos e habilidades. Outro aspecto importante deve ser levado em consideração: a perda de capital humano. 

Os jovens são uma fonte vital de inovação, criatividade e novas ideias. Quando estão desocupados, esses talentos não são aproveitados de maneira adequada, resultando em uma perda de potencial de crescimento econômico. Para o economista Riezo Almeida, a melhor opção é investir nas áreas de tecnologia. “Os mais jovens já nasceram com a tecnologia, então é um aliado”, afirma.

O sociólogo José Deocleciano acredita que, no momento, o país depende dos movimentos da economia para que os jovens tenham oportunidades de trabalho. “O governo atual tem um olhar específico para as políticas sociais e existe a probabilidade de que programas semelhantes aos que ocorreram no passado, como ‘Meu Primeiro Emprego’  e ‘
Projovem’ possam ser implementados novamente.” 

Em suma, o mercado de trabalho atual apresenta um cenário desafiador para os jovens, que, muitas vezes, acaba resultando em desocupação e empregos precários. No entanto, é possível reverter essa situação por meio da implementação de políticas adequadas e do investimento em capacitação, além da cooperação entre governo, instituições educacionais, setor privado e organizações da sociedade civil. Essa colaboração e sinergia entre os diversos atores podem resultar em soluções mais abrangentes e eficazes, assegurando que os jovens tenham acesso a oportunidades de trabalho dignas e que suas habilidades e talentos sejam plenamente aproveitados.

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